Médicos cubanos:
avança
a integração da América Latina!
Por Beto Almeida,
Brasilia. 26 de agosto de 2013
Não faltaram emoção, lágrimas e dignidade
na chegada dos 176 médicos cubanos, que desembarcaram neste sábado à noite em
Brasília, para um trabalho indispensável em municípios brasileiros, mais de 700,
ainda sem qualquer assistência médica. Quando aqueles cidadãos cubanos, muitos
deles negros, muitas mulheres, com bandeirolas brasileiras e cubanas nas mãos,
pisaram o solo brasileiro, ali estava o retrato do enorme progresso social,
educacional e sanitário alcançado pela Revolução Cubana. Mas, também, uma prova
concreta de que a integração da América Latina está avançando; não é só
comércio, é também saúde. O Brasil coopera com Cuba na construção do Complexo
Portuário de Mariel - sua mais importante obra de infra-estrutura
atualmente - e Cuba coopera com o Brasil preenchendo uma lacuna imensa, a falta
de médicos.
A campanha conservadora contra a
integração latino-americana sofrerá um revés tremendo quando o programa Mais
Médicos , começar a apresentar seus efeitos concretos. Esses resultados terão a
força para revelar o teor medieval das críticas feitas pelas representações
médicas e pela mídia teleguiada pelos publicidade da indústria farmacêutica.
Volumosa
desinformação
Tendo em vista o volume de desinformação
que circulou contra a vinda de médicos estrangeiros, mas contra os médicos
cubanos em especial, é obrigatório travar a batalha das idéias, primeiramente,
em defesa da Revolução Cubana como uma conquista de toda a humanidade. Cercada,
sabotada, agredida, a Revolução Cubana, que antes de 1959, possuía os mais
tenebrosos indicadores sociais, analfabetismo massivo, mortalidade infantil
indecente, desemprego e atraso social generalizado, consegue libertar-se da
condição de colônia, e, mesmo sem ter uma base industrial como a brasileira, por
exemplo, e passa a exportar médicos, professores, vacinas,
desportistas.Exporta, principalmente, exemplos!
Esse salto histórico da Revolução Cubana
deixa desconcertada a crítica, seja emanada pela mídia colonizada pelas
lucrativas transnacionais fabricantes de fármacos ou equipamentos hospitalares,
seja a crítica oligarquia difundida pelas representações médicas. Os que
questionam a qualidade da formação profissional dos médicos cubanos são
desafiados a responder por que a mortalidade infantil em Cuba é das mais baixas
do mundo, sendo inferior, inclusive, àquela registrada no Estado de Washington,
nos EUA?
Cuba e a libertação africana
Vale lembrar que Cuba possuía, antes de
1959, pouco mais de 6 mil médicos, dos quais, a metade deixou o país porque não
queria perder privilégios, nem concordava com a socialização da saúde. Apenas
cinco décadas depois, é esta mesma Cuba que tem capacidade de exportar milhares
de médicos para socorrer o povo brasileiro de uma indigência grave construída
por um sistema de saúde ainda determinado pelos poderosos interesses das
indústrias hospitalar, farmacêutica e de equipamentos, privilegiando a noção de
uma medicina como um negócio, uma atividade empresarial a mais, não como um
direito, como determina nossa constituição.
Já em 1963, quando a Revolução na Argélia
precisou, iniciou-se a prática de cubana de enviar brigadas médicos aos povos
irmãos. Ensanguentada pela herança da dominação francesa, a Revolução Argelina
encontrou em Cuba a fraternidade concreta, quando ainda não havia na Ilha um
contingente médico tão numeroso como o existente atualmente. Predominou sempre
na Revolução Cubana a idéia de que em matéria de solidariedade internacional
comparte-se o que se tem, não o que lhe sobra. Foi exatamente ali na Argélia
que se estabeleceram laços indestrutíveis entre a Revolução Cubana e os
diversos movimentos de libertação da África. A partir daí, Cuba participou com
brigadas militares e médicas em diversos processos de libertação nacional do
continente. De tal sorte que, em 1966, a primeira campanha de vacinação contra a
poliomielite realizada no Congo, foi organizada por médicos cubanos! Os CRMs
conhecem esta informação? Sabem que a poliomielite foi erradicada em Cuba
décadas antes do Brasil fazê-lo?
Será que o
Revalida capaz de avaliar a dimensão libertadora da medicina cubana?
Quando Angola foi invadida por tropas do
exército racista da África do Sul, baseado nas supremas leis do
internacionalismo proletário, Agostinho Neto, presidente angolano, também médico
e poeta, solicita a Fidel Castro ajuda militar para garantir a soberania da
nação africana. Uma das mais monumentais obras de solidariedade foi realizada
por Cuba que, ao todo, enviou a Angola, cerca de 400 mil homens e mulheres para,
ao lado dos angolanos e namíbios, expulsar as tropas imperialistas sul-africanas
tanto de Angola como da Namíbia. E sob a ameaça de uma bomba atômica, que Israel
ofereceu à África do Sul, argumentando que as tropas cubanas tinham que ser
dizimadas porque pretendiam chegar até Pretória..... Na heróica Batalha de Cuito
Cuanavale - que todos os jornalistas, historiadores, militantes deveriam
conhecer a fundo - lá estavam as tropas cubanas, mas lá estavam também as
brigadas médicas de Cuba, que se espalharam por várias pontos de Angola. A
vitória de Angola e da Namíbia contra a invasão da África do Sul, foi também a
derrota do regime do Apartheid. Citemos Mandela: “ A Batalha de Cuito Cuanavale
foi o começo do fim do Apartheid. Devemos o fim do Apartheid a Cuba!”.
Qual exame Revalida será capaz de
dimensionar adequadamente o desempenho de um médico cubano em Cuito Cuanavala,
com sua maleta de instrumentos numa das mãos e na outra uma metralhadora,
livrando a humanidade da crueldade do Apartheid? Como dimensionar o bem que o
fim do Apartheid, com a decisiva participação cubana, proporcionou para a saúde
social da História da Humanidade?
As crianças de
Chernobyl em Cuba
sentido de solidariedade
internacionalista está tão plasmado na sociedade cubana que, quando aquele
terrível acidente ocorreu na Usina Nuclear de Chernobyl, em 1986, o estado
cubano recebeu, das organizações dos Pioneiros - que congregam crianças e
adolescentes cubanos - a proposta de oferecer tratamento médico às crianças
contaminadas pela radioatividade vazada no desastre. Um documentário realizado
pelo extinto Programa Estação Ciência, dirigido pelo jornalista Hélio Doyle,
exibido com freqüência TV Cidade Livre de Brasília, registra como Cuba
compartilhou seus recursos médicos e hospitalares, mas, sobretudo, sua fraterna
solidariedade com cerca de 3 mil crianças russas que foram levadas para
tratamento na Ilha, nas instalações dos Pioneiros, em Tarará. Destaque-se,
primeiramente, que a idéia partiu dos Pioneiros. Segundo, que Cuba não se
colocava na condição de doadora, mas apenas cumprindo um dever solidário.
Lembravam que o povo soviético havia sido solidário com Cuba quando os EUA
iniciaram o bloqueio contra a Ilha cortando a cota de petróleo e do açúcar,
suspendendo o comércio bilateral, na década de 60. A URSS passou a comprar todo
o açúcar cubano, pelo dobro do preço do mercado internacional, e a abastecer
Cuba de petróleo, pela metade do preço de mercado mundial. São páginas escritas,
em uma outra lógica, solidária, fraterna, socialista. É de se imaginar o quanto
os dirigentes das representações médicas brasileiras poderiam aprender com
aquelas crianças cubanas que ofertaram tratamento às 3 mil crianças russas, um
contingente menor que o de médicos cubanos que virão para o Brasil?
Impublicável
A cooperação entre Brasil e Cuba em
matéria de saúde não está iniciando-se agora. Durante o governo Sarney, recém
re-estabelecidas as relações bilaterais, em 1986, foram as vacinas cubanas
contra a meningite que permitiram ao nosso país enfrentar aquele surto. Na
época, a mídia teleguiada também fez uma sórdida campanha contra o governo
Sarney, primeiro por reatar as relações, mas também por comprar grandes lotes da
vacina desenvolvimento pela avançada ciência de Cuba. De modo venenoso,
tentou-se desqualificar as vacinas, afirmando serem de qualidade duvidosa, tal
como agora atacam a medicina cubana. Na época, foram as vacinas cubanas que
permitiram controlar aquele surto e salvar vidas. Mas, também trouxeram, por
meio do exemplo, a possibilidade de que aprendêssemos um pouco dos valores e das
conquistas de uma revolução. Afinal, por que um país com poucos recursos, com
uma base industrial muito mais reduzida, conseguia não apenas elevar
vertiginosamente o padrão de saúde de seu povo, mas, também desenvolver uma
tecnologia com capacidade para produzir e exportar vacinas, enquanto o Brasil,
com uma indústria muito mais expandida, capaz de produzir carros, navios e
aviões, não tinha capacidade para defender seu próprio povo de um surto de
meningite? São sagradas as prioridades de uma revolução. E é por isso, que,
ainda hoje, a sexta maior economia do mundo, se vê na obrigação de recorrer a
Cuba para não permitir a continuidade de um crime social configurado na não
prestação de atendimento médico a milhões de brasileiros.
Mais recentemente, quando a Organização
Mundial da Saúde convocou a indústria farmacêutica internacional a produzir
vacinas para combater um tenebroso surto de febre amarela que se espalhou pela
África, obteve como resposta desta indústria o mais sonoro e insensível NÃO. Os
preços que a OMS podia pagar pelas vacinas não eram, segundo as transnacionais
farmacêuticas, apetitosos. Milhões de vidas africanas passaram correr risco,
não fosse a cooperação entre dois laboratórios estatais, o Instituto Bio
Manguinhos, brasileiro, e o Instituto Finley, cubano. Essa cooperação permitiu
a produção, até o momento, de 19 milhões de doses da vacina que a África
necessitava, a um preço 90 por cento menor que o preço do mercado internacional.
Onde foi publicada esta informação?
Apenas na Telesur e na imprensa
cubana. A ditadura dos anúncios da indústria farmacêutica, que dita a linha
editorial da mídia brasileira em relação ao programa Mais Médicos e à
cooperação da Medicina de Cuba, simplesmente impediu que o grande público
brasileiro tomasse conhecimento desta importantíssima cooperação estatal
brasileiro-cubana.
Os médicos cubanos e o furacão Katrina
Para dimensionar a inqualificável onda de
insultos que os médicos cubanos vêm recebendo aqui na mídia oligárquica,
lembremos um fato também sonegado por esta mesma mídia, o que revela suas
dificuldades monumentais para o exercício do jornalismo como missão pública.
Quando ocorre o trágico furacão Katrina, que devasta Nova Orleans, deixando uma
população negra e pobre ao abandono, dada a incapacidade e o desinteresse do
governo dos EUA naquela oportunidade, em prestar-lhe socorro, também foi Cuba
que colocou à disposição do governo estadunidense - malgrado toda a
hostilidade ilegal deste para com a Ilha - um contingente de 1300 médicos
, postados no Aeroporto de Havana, com capacidade de chegar prestar ajuda à
população afetada pelo furacão. Aguardavam apenas autorização para o embarque, e
em questão de 3 horas de vôo estariam em Nova Orleans salvando vidas. Esta
autorização nunca chegou da Casa Branca. A resposta animalesca do presidente
George Bush foi um sonoro NÃO à oferta de Cuba, o que tampouco foi divulgado
pela mídia oligárquica, provavelmente para protegê-lo do vexame de ver difundido
seu tosco caráter, que tal recusa representava. Os Eua estão sempre prontos
para enviar militares e mercenários pelo mundo. Mas, são incapazes de prestar
ajuda ao seu próprio povo, e também arrogantes o suficiente para permitir uma
ajuda de Cuba à população pobre e negra afetada pelo furacão.
Uma Escola de Medicina
para outros povos
Também não circulam informações aqui de
que Cuba, após o furacão Mity, que devastou a America Central e parte do Caribe,
decide montar uma Escola Latino-americana de Medicina, que, em pouco mais de 10
anos de funcionamento, já formou mais de 10 mil médicos estrangeiros,
gratuitamente. Entre eles, 500 jovens negros e pobres dos EUA, moradores dos
bairros do Harlem e do Brooklin. Eles me revelaram que se tivessem continuado a
viver ali, eram fortes candidatos a serem presa fácil do narcotráfico. Frisavam
que, estar ali em Cuba, formando-se em medicina, gratuitamente, era uma
possibilidade que a maior potência capitalista do mundo não lhes oferecia. Há,
estudando na ELAM, cerca de uma centena de jovens do MST, filhos de assentados
da reforma agrária. Isto significa que Cuba compartilha com vários países do
mundo seus modestos recursos. Também estudam lá cerca de 600 jovens do Timor
Leste, sendo que existem 40 médicos cubanos trabalhando já agora no Timor. O
tipo de exame Revalida seria capaz de dimensionar esta solidariedade cubana com
a saúde dos povos?
Ampliar a integração em outras áreas
Também não se divulgou por aqui, que
Cuba montou três Faculdades de Medicina na África, (Eritreia, Gambia e Guiné
Equatorial), em pleno funcionamento, com professores cubanos. Toda esta
campanha de insultos contra Cuba e os médicos cubanos, abre uma boa
possibilidade para discutir e conhecer mais a fundo todas estas conquistas da
Revolução Cubana, mas, especialmente, para que as forcas progressistas reflitam
sobre quantas outras possibilidades de cooperação existem entre Brasil e Cuba,
em muitas outras áreas. Mas, serve também para reavaliar a posição de certos
parlamentares médicos da esquerda no Brasil que se opõe, inexplicavelmente, ao
Programa Mais Médicos, alguns chegando, ao absurdo de terem apresentado
projetos de lei proibindo, pelo prazo de 10 anos, a abertura de qualquer novo
curso de medicina no Brasil.
Qualificar o debate sobre a integração
Enfim, um debate democrático e
qualificado em torno do programa Mais Médicos, da presença de médicos cubanos
aqui no Brasil e em mais de 70 países, e também, sobre as conquistas da
Revolução Cubana, deve ser organizado pelos partidos e sindicatos, pelo
movimento estudantil, pelos movimentos sociais, pela Solidariedade a Cuba, pelas
TVs e rádios comunitárias, como forma de impulsionar a integração da America
Latina, que, neste episódio, está demonstrando o quanto pode ser útil à
população mais pobre. A TV Brasil pode cumprir uma função muito útil, pode
divulgar documentários já existentes sobre o trabalho de médicos em regiões
inóspitas e adversas em diversos países.
É preciso expandir esta integração,
avançar pela educação, pela informação, não havendo justificativas para que o
Brasil ainda não esteja conectado com a Telessur, por exemplo, que divulgado
amplo material jornalístico informando que 3 milhões e meio de cidadãos
latino-americanos já foram salvos da cegueira graças a Operação Milagro, pela
qual médicos cubanos e venezuelanos realizam, gratuitamente, cirurgias de
cataratas em vários países da região. Enquanto o povo argentino, por exemplo, já
pode sintonizar gratuitamente a Telesur e informar-se de tudo isto, o povo
brasileiro está impedido, praticamente, de receber informações que revelam o
andamento da integração da America Latina. Mas, com a chegada dos médicos
cubanos, a integração será cada vez mais pauta da agenda do debate político
nacional e receberá , certamente, um impulso político e social, notável, pois
o povo brasileiro, saberá , com nobreza e humanismo, valorizar e apoiar o
programa Mais Médicos. Alias, é exatamente isto o que tanto apavora a medicina
capitalista.
Há 70 mil engenheiros
estrangeiros no Brasil hoje!
Segundo dados recentes do Ministério do
Trabalho, existem hoje trabalhando no Brasil cerca de 70 mil engenheiros
estrangeiros. Nenhuma gritaria foi feita. Neste caso, trata-se de petróleo e
outros projetos, muito lucrativos para as multinacionais. Mas, quando se trata
de salvar vidas, acendem-se todas as fogueiras do inferno da nova inquisição
contra uma cooperação que é lógica e indispensável, solidária e humanitária. Por
que é aceitável a importação de telefones, equipamentos médicos, remédios,
cosméticos, roupas, caviar, bebidas, vacinas e não se aceita a cooperação de
médicos de Cuba, sendo este o único pais em condições objetivas de
apresentar-se prontamente e de maneira eficaz com profissionais experimentados.
Será que as representações médicas brasileiras possuem sequer uma remota idéia
de que estão proferindo insultos a esta bela história da medicina socialista de
Cuba?
Quem pagará a conta da
demora?
A presidenta Dilma tem inteira razão em
convocar os Médicos Cubanos, algo que já poderia ter sido feito há mais tempo,
amenizando a dor e o sofrimento de milhões de brasileiros abandonados por um
sistema de saúde e por uma mentalidade de parcelas das representações médicas
que, por mais absurdo que pareça, ainda tentam justificar este abandono. Aliás,
com a determinação da presidenta Dilma está absolutamente revelada a importância
da integração da América Latina, não havendo justificativas para que esta
modalidade de integração nas esferas sociais, não avance também para outras
áreas, como a educação, por exemplo. Foi exatamente com o método cubano
denominado “Yo, si, puedo”, que Venezuela, Bolívia, Equador são países
declarados pela UNESCO como “Territórios Livres do Analfabetismo”, sempre com a
participação direta de professores cubanos. Muito em breve, será a Nicarágua,
que vai recuperar aquele galardão, que já havia conquistado durante a Revolução
Sandinista, mas depois perdeu, na era neoliberal. Por quanto tempo o Brasil
terá apenas projetos pilotos, em apenas 3 cidades, com o método de alfabetização
cubano, que, aliás, já tem absoluta comprovação e reconhecimento mundiais? Que
espera a sexta economia do mundo em convocar ainda mais a cooperação cubana
para erradicar o analfabetismo? Quem pagará a conta desta injustificável
demora?
Termino com a declaração da Dra Milagro
Cárdenas Lopes, cubana, negra, 61 anos “Somos
médicos por vocação, não nos interessa um salário, fazemos por amor”, afirmou.
Em
seguida, dirigiu-se com seus companheiros para os ônibus organizados pelo
Exército Brasileiro, que cuida de seu alojamento. Sinal de que a integração está
escrevendo uma nova página na história da América Latina.
Beto Almeida
Diretor da Telesur
25 de agosto de 2013